Lages, Santa Catarina. Cidade de clima atípico, diferente do restante do país: é terra do frio, do pinhão e da cultura tradicionalista. Uma paixão, no entanto, ela tem em comum com o restante do Brasil, com seu devido reconhecimento espalhado graças às jovens Leoas da Serra, time de futsal feminino que hoje tem notoriedade internacional: o esporte. Essa semana elas embarcam para Madri, Espanha para o Intercontinental Feminino, competição que simboliza muito mais do que um título esportivo. As atletas Diana, Amandinha e Greice representam toda a garra do time. “Não jogamos por um troféu, jogamos em busca de dignidade para o futsal feminino brasileiro”
Foi em 2013 que o Leoas da Serra começou a ganhar forma. “Eu estava no time Inter de Lages e dentro dele criamos o Inter de Lages Futsal Feminino, que existiu até 2014”, relembra Maurício Neves de Jesus, criador do projeto e atual diretor esportivo. “Em janeiro de 2015 criamos a Associação Leoas da Serra para seguirmos com autonomia”. O nome surgiu em decorrência da mascote do Inter de Lages, o leão-baio. “Quando elas jogavam, por conta dele as chamavam de leoas, daí o nome”.
Em 2016, quando resolveram fortalecer a equipe de alto rendimento, o time viu sua popularidade crescer. Contrataram atletas de ponta, sendo alguns dos exemplos Diana, Greice e Amandinha. O trabalho das Leoas na comunidade, na época, já era referência. “Tanto que fomos agraciados com o Prêmio Gustavo Kuerten como destaque na inclusão social”, relembra Mauricio. A grande repercussão na mídia fez com que o time levantasse voo. Hoje, colecionam títulos e importantes conquistas. As mais recentes são a Copa das Campeãs, a Copa Libertadores, a Copa Santa Catarinense, a Liga Catarinense e o Brasileiro Universitário.
As Leoas
Diana Santos é símbolo do futsal feminino brasileiro: tetracampeã mundial com a seleção brasileira, a fixa iniciou sua trajetória conjunta com a melhor do mundo, Amandinha no Barateiro, de Brusque (SC) em 2011. Uma das maiores atletas do futsal feminino no país, a atual capitã das Leoas esteve no Top 10 do Umbro Futsal Awards – prêmio que escolhe os melhores do mundo – nas últimas três temporadas. “Eu não tenho nem como contar a minha vida sem o futsal. Desde pequena eu jogava bola com os meninos na rua. Sempre preferi a bola às bonecas. O que era uma brincadeira virou minha vida. Graças ao futsal me formei e graças a ele faço mestrado, junto com a Amandinha. Dizer que a quadra é tudo pra mim não é só um clichê, é a verdade da minha vida”, conta Diana.
Greice Behm, ala, pivô e fixa é a atleta polivalente do time. “Jogo desde que me lembro, o futsal me apresentou o mundo”. Pelas Leoas, foi artilheira da Taça Brasil 2016 e da Copa do Brasil 2017. Neste mesmo ano foi convocada para a seleção brasileira, mas uma lesão a impediu de jogar os amistosos e a Copa América. Para ela, seria impossível prever um campeonato desse porte quando chegou no time. “A gente só sabia que era necessário crescer. Independentemente do resultado, jogar um campeonato com status de Mundial é uma vitória. Vamos deixar tudo dentro de quadra para sair com o título”.
Amandinha virou um nome conhecido internacionalmente por quem gosta de esporte. Ala das Leoas, Amanda Lyssa Crisóstomo é tricampeã mundial com a seleção brasileira e cinco vezes consecutivas a melhor atleta de futsal feminino do mundo. Saiu de sua casa, em Fortaleza aos 15 anos. Hoje, aos 24 é reconhecida como a maior jogadora de futsal feminino de todos os tempos. Sem surpresas, o esporte acompanha ela desde a infância. “Começou lá na quadra do Conjunto Fortaleza, no projeto que meu primeiro treinador, o André, desenvolvia com crianças da comunidade. Aí comecei a jogar no Colégio Evolutivo e em uma competição fui observada pelo Esquerda, que hoje é nosso treinador nas Leoas e na época treinava o Barateiro de Brusque”. Graças ao convite dele, Amandinha se mudou para Santa Catarina, onde está até hoje, sem planos de sair. “Ao futsal eu devo todas as minhas realizações”.
As dificuldades
“Falo por todas nós porque sei que pensamos a mesma coisa”, inicia Amandinha. “O futsal feminino não é suficientemente valorizado. É nossa maior dificuldade”, diz. “Faltam times como o Leoas, que pensa e age com grandeza. Nossas empresas apoiadoras, como a NDD, entendem a importância de um mundo mais equilibrado entre homens e mulheres”. Apesar das adversidades, a jovem espera que a modalidade saia fortalecida. “Ultimamente estamos sendo o pilar do futsal feminino, promovendo competições, atraindo mídia e mostrando que o profissionalismo é o caminho a ser seguido. Dentro da quadra, é claro, espero que a gente saia com o título”.
O mundial
A disputa será dividida em dois jogos: dia 8 em Madri e dia 23 em Lages, no Ginásio Jones Minosso. Foi graças a Mauricio Neves que a competição, até então inédita para as mulheres, surgiu. “Nunca houve a edição do campeonato mundial feminino de clubes. O masculino iniciou exatamente assim, o confronto do campeão sul-americano contra o europeu e chamado de intercontinental. Quando ganhamos a Libertadores no ano passado, mantive contato com o presidente do Atlético Navalcarnero, que havia recém conquistado o Campeonato Europeu. Dei a ideia de realizarmos a Primeira Copa Intercontinental, um jogo em cada país. A conversa evoluiu, conseguimos homologação das confederações nacionais e, graças à Naiara Gresta da CBFS, a chancela da Fifa”. Para ele, é o momento de afirmação não só do time, mas de todo o futsal feminino internacional.
A falta de calendário tem sido um problema crônico, mas o Intercontinental promete trazer uma visibilidade capaz de reorganizar a modalidade.
“Temos a responsabilidade de representar não apenas nosso time, não apenas Lages, mas todo o país. Minha expectativa é que seja um campeonato que mude a história do futsal feminino brasileiro, tanto em termos de visibilidade quanto em investimento. Sabemos de todo sacrifício que foi feito para isso. Estamos ansiosas para que a bola role”.
Diana
A NDD
A busca por soluções tecnológicas de ponta da empresa NDD, sediada em Lages tem características parecidas com aquelas que as Leoas possuem. Garra, dedicação, criatividade e talento são parte delas. O conhecimento desenvolvido na empresa, levado ao mundo todo é gerado na cidade das Leoas, por isso a importância de valorizar a região e apoiar o time. “Temos um papel fundamental na nossa região e um apreço muito grande por ela. Queremos mostrar isso cada vez mais”, diz Valmir Tortelli, presidente da NDD. “Estamos dando todo nosso apoio e vestindo a camisa das Leoas da Serra nesta importante competição por vir. Elas têm a responsabilidade de representar não só Lages e a nossa região, mas também o Brasil. Estamos muito contentes com a trajetória de luta e dedicação das meninas e fazer parte disso, apoiando-as, é muito especial para nós”.
O principal prêmio para as Leoas, que carregam consigo tantas lutas e tanta responsabilidade, definitivamente não é a taça. Amandinha, a melhor do mundo, passa com tranquilidade e orgulho, em nome de todas suas companheiras de time, a mensagem indispensável para este importante momento. “Torçam por nós. Não jogamos por um troféu, jogamos em busca de dignidade para o futsal feminino brasileiro e por um mundo mais justo nas questões sociais e de gênero”.